Corning, 26 de abril de 1952
Minha querida Ilza:
Embora sem cartas de você, escrevo mais esta (que não terá resposta escrita) para dar mais algumas notícias do que tenho feito nesta penúltima semana de Corning:
O
pessoal tem sido muito
camarada. Tenho
recebido, agora que se
aproxima a partida, vários
convites para
almoçar ou
jantar. Assim é que, na
3ª. feira, fui
jantar na casa de
Jack Connelly (conhecido do Ceppo), e que deve partir para o
Brasil, para a S. M., em
Junho afim de ajudar o
Athos na
montagem e
funcionamento da nova
máquina de tubos.
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Forno 14 - responsável pela fabricação de refratários (1953) |
Tenho dado lições de português a ele. É muito boa pessoa. É casado com três filhos, tendo perdido a mais velha há dois meses, em conseqüência de uma queda e antiga fratura sofrida na cabeça. Ele mora há uns 4 kms. fora de Corning, nessas casas tipo de campo. Parecem viver modestamente (em relação ao nível americano).
Foi um jantar simples, mas mais saboroso do que estes que comemos nos restaurantes e bares.
Sopa de vegetais, carne cozida (carne é um prato raro aqui) ou ensopada, com batatas cozidas ao forno; ervilhas e cenouras de lata;
Sobremesa: sorvete que tomamos (eles tomam e eu também...) misturado com o café com leite... Um precursor do Affogato! (Receita)
Conversamos até as
10 horas e parece que a
senhora e a
molecada (um menino de
5, uma menina de
2 e um bebê de
6 meses)
gostaram de mim.
Ah!
Depois do jantar, fomos para a
cozinha (sistema americano) ajudar na
arrumação. A mulher ficou
olhando; o marido
lavou os pratos (numa pia
funda, torneira com água
quente, fervendo,
abundante) e eu
enxuguei...
Como
vê, foi bom o
curso prévio que eu fiz com
você aí em
nossa cozinha.
Era uma casa de campo,
simples, mas a cozinha
melhor do que a
nossa aí.
Geladeira,
maq. de lavar roupa, pia com
duas divisões,
orifícios de saída da água bem
grandes, sem perigo de
entupimento, água
fervendo abundante,
tudo fácil; em
15 minutos estava tudo pronto.
4ª. feira, almocei em restaurante, convidado por outro amigo daqui; economia dos dólares do almoço...
5ª. feira, o Krockmalski, afinal, convidou-me para ir jantar na casa dele. Foi excelente a comida, com sabor tipicamente brasileiro; a senhora, que ainda não conhecia, falou com simpatia do Brasil, com saudades das suas frutas, comidas, etc., mostrou-me fotografias do “Bol”, cuja morte sentiram muito; a menina, que está com 10 anos, gorda e inteligente, lembrava-se do cachorro e coisas do Brasil.
Esta gente, os americanos, são amabilíssimos quando recebem. A sra. Krock. recebeu-me dizendo, “como vai Homero”. Houve cocktails, vimos fotos do Brasil, ela gostou muito da bolsa (diz que daquela qualidade aqui não existe), falou do quadro (lembra-se?) visita do Rio, que está exposto na sala de jantar.
Casa
pequena, mas muito
boa,
alegre, que ele alugou. Saí às
11.30hs., pois
não me
deixaram sair antes. Ontem ele (
o Krockm.) voltou para
convidar-me para o
Breakfast (café da manhã!) de
domingo, amanhã, pois, a sra. vai
oferecer-me Pankekas, só porque eu
falei que
gostava de panquecas...
2ª. feira já estou convidado para jantar na casa de outro americano, um rapaz aqui do escritório da Corning, tendo eu recusado (por excesso de compromissos) um outro jantar para a mesma noite com outro cidadão.
4ª. feira, então, haverá um almoço da Corning (chefes com quem eu convivi aqui) como despedida da minha permanência em Corning. Como vê, estou sendo assediado!
Começarei hoje a arrumar os
baús e estou pensando nas
dificuldades que vou ter.
Comprei, por intermédio de um amigo de
N.Y., a
geladeira (230.00) e a
Maq. de Lavar roupa (280.00) prontas para
embarcar comigo no
dia 3, se Deus
quizer.
Restam-me
poucos dólares que vou
tenteando até N.Y. Comprei o seu
tailleur e o de Marília, por
12.00 cada, mas
não é de
lã ou casemira, mas de uma
mistura de rayon e nylon: bonito. Não se
acha mais nada de
lã e os
sweaters que comprei (
não gostei) são de mistura de
nylon e rayon.
Escrevi hoje ao Sr. Moreira, fazendo o relatório destas últimas semanas, e anunciando a bomba atômica da minha volta por navio...
Procure saber, indiretamente, com o Athos ou Paulo, qual foi a reação.
Bem, vou por esta no correio.
Beijinhos nas crianças e um saudoso abraço do marido que a ama,
Homero